Morte é uma palavra feia e assustadora para muitos, para outros é apenas algo natural que acontecerá com todos nós, sem nenhum temor. 

O que é a morte para você? Difícil responder essa pergunta, né? 

Eu estive de cama, por três dias seguidos na semana passada. Achei que era covid-19, me senti destruída. No meio da dúvida se era ou não o vírus, eu pensei em muitas coisas, e na possibilidade de morrer, de tão mal eu fiquei, e com o tamanho do medo que me assolou então. "E se eu morrer? Qual legado estarei deixando? E a minha filha de 10 anos? Não quero morrer, não quero ir agora. Não posso ir." Eu me neguei a todo custo que fosse o vírus, rejeitei todas as possibilidades de eu estar infectada. Eu estou de quarentena há mais de um ano. Há mais de um ano não sei o que é ir no shopping, cinema, nem mesmo o mercado. Há mais de um ano não sei o que é sair com alguém, beijar, ter uma vida amorosa, sexo, nada. Há mais de um ano estou vivendo entre quatro paredes esperando por dias melhores e ser vacinada, me sentir mais segura e tranquila com o futuro incerto. Há mais de um ano eu protejo minha filha de tudo, sem escola, sem visita, sem amigos. Há mais de um ano eu tento confiar na misericórdia de Deus, de Ele nos salvar desses tempos tenebrosos que esse governo nos trouxe junto com sua irresponsabilidade social e política. Então, não mereço morrer desta maneira, e me recuso a partir assim. Eu lutei para não me sentir tão fraca e então, saí da cama, cambaleando de um lado para o outro e fiz as minhas coisas normalmente, mesmo com febre, com tosse e o nariz parecendo uma torneira de tão congestionado. Não vou morrer assim, pensei.

Rezei muito também. Falei muito com a minha avó que já faleceu há uns sete anos, que eu acredito que ela está sempre perto de mim, pedi a ela para continuar me protegendo como sempre fez em vida. E estou melhor agora, ainda me recuperando e me cuidando. 

Quando eu penso nas coisas que pensei enquanto estava acamada, sem forças físicas para me levantar, com uma gripe violenta, me pego a perguntar nas coisas que as pessoas que faleceram de covid-19 pensaram antes de morrer. O medo nos olhos, na alma. "O que virá depois da morte, para onde irei?" São perguntas que eles devem ter feito, e não obtiveram respostas, ou tentaram acreditar que iriam para algum lugar melhor, seguindo suas crenças, suas esperanças. 

Na doutrina que sigo, que é o espiritismo segundo Allan Kardec, fazendo de mim uma kardecista convicta, acredito em vida pós-morte. Que há sim, o outro lado, o recomeço e o reconhecimento da alma, da vida passada e futura. Mas eu não sei para onde irei depois de deixar essa vida, eu não faço a mínima ideia se seguirei a luz e conseguirei o passe para o melhor lugar, que chamamos de céu. 

Estou terminando alguns ajustes no meu livro A última Lágrima do Paraíso, e tenho me perguntando sobre o céu, os guias, a passagem da morte para o outro lado, então tenho lido muitos relatos e aprendendo muito, mas nunca sabemos de tudo, e acho que nunca saberemos, pois sempre há alguma coisa oculta que só saberemos no final de todo aprendizado, uma conclusão.  E sim, eu tenho medo da morte. Eu tenho medo da passagem, se ela será dolorosa, se será traumática. Eu tenho mais medo ainda pela minha filha de apenas dez anos, eu não quero deixa-la.

Quando eu dei a luz a Ana, tive complicações e quase morri. Desmaiei na mesa de parto, e depois do efeito da anestesia. Dois desmaios. Além da perda de sangue que se seguiu de uma anemia crônica, tive inflamações nos pontos do parto normal, que precisou da ajuda de um fórcepes para puxar a bebê. Era tarde demais para uma cesária. E eu pedi que fosse cesária desde que cheguei ao hospital, mas a médica insistiu no parto natural. Me largaram na maca por mais de dez horas e só perceberam que eu estava em trabalho de parto quando viram uma poça de sangue saindo do meu ventre, e eu estava implorando para fazer a cesária. A médica ignorou. Resultado disso foi a minha quase morte. Minha filha nasceu bem, saudável e grande para o meu pequeno corpo, já que sou toda pequena com 1,56 de altura. Sobrevivi com muito custo, eu renasci. Passei os dois anos dela cuidando sozinha, sem ajuda, sem orientação, sem ninguém. Nada. A internet me salvou em muitos momentos. Depois tive outro relacionamento que foi um bálsamo para a minha solidão e segundo pai para Ana. Eu passei por muita coisa durante os primeiros anos dela, muitas humilhações vindo do pai dela. Aos 4 anos dela, início de sua vida escolar, ela pegou uma pneumonia bacteriana, e ficou internada por dois meses em estado grave, e foi isso que fez com que o pai dela e eu acábassemos de vez com as brigas e acusações inúteis, e sermos pais melhores para Ana. E foram meses muito dolorosos para mim, que fiquei 24 horas com ela no hospital, não saí para nada, nem quando eu também estava com pneumonia e em tratamento. Fiquei com ela até o fim. Então, não posso me dar o luxo de pensar em morrer agora, por motivo nenhum. Se a depressão me abate, eu ouço músicas, vejo séries, me apaixono pelos personagens dos meus livros, escrevo, leio, ocupo a minha mente com qualquer coisa para não dar mais espaço para a depressão. 

E quando eu morrer, não quero choro, nem lamentações. Não quero traços de arrependimentos no rosto de ninguém. Quero alegria, orgulho por terem feito parte da minha vida. Quero sorrisos. Sei que pode ser doloroso para muita gente, ou não, eu sei que para minha filha com certeza será, seja qual for o dia que deixarei essa vida. A ela, eu não posso pedir muita coisa, sei que será como arrancar o coração do peito dela, mas, para outras pessoas, quero que sorriam, pois estiveram na vida, cada um com sua participação especial, ou passageira. Ah, não queria ser enterrada... Prefiro ser cremada e ter as cinzas jogadas no jardim da casa da minha avó, mas acredito que minha filha não quererá fazer isso, então, me enterrem num lugar que ela desejar, ou me cremem e joguem as minhas cinzas onde ela pedir. A vontade dela deve ser prevalecida, sempre.

"A morte é uma passagem, mas de todo o jeito, é o fim de alguma coisa antes do recomeço de outra"

Ellen Roza